Os pequenos terrenos que cercam algumas das unidades básicas de saúde (UBSs) do Distrito Federal são, para muitos, uma fonte viva de bem-estar físico e mental. Nas pequenas hortas, conhecidas também como hortos agroflorestais, a comunidade tem acesso a um espaço de cultivo tocado por voluntários que descrevem o local como um refúgio de cura e conexão.
É o que aponta o aposentado Francisco Apolinário da Silva, um dos moradores de Ceilândia que, com 74 anos, cuida do cantinho da UBS 9 da cidade com dedicação e disposição, visíveis nas mãos que preparam a terra para o próximo plantio. “Eu chego, respiro um ar mais puro e tomo um banho de energia positiva. Essa é a parte que eu mais gosto no horto – quando eu entro ali, tenho um tempo comigo mesmo e parece que estou numa floresta. Antes eu tinha depressão. Hoje penso em coisas boas, tenho outra vida e uma vontade de viver cada dia mais. Me sinto mais entusiasmado e não pretendo parar por aqui”, relata.
A Rede de Hortos Agroflorestais Medicinais Biodinâmicos (RHAMB) foi criada há sete anos, como parte das práticas integrativas em saúde da Secretaria de Saúde (SES-DF) e da Fiocruz Brasília, com foco no fortalecimento da atenção primária à saúde. O local funciona com base na agricultura biodinâmica, uma prática que aproxima o ser humano da natureza e estimula o cuidado com a saúde de maneira holística, unindo as áreas física, mental e emocional. Os hortos são voltados ao cultivo comunitário de plantas medicinais e alimentos, além de serem espaços terapêuticos para usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).

O horto da UBS 9 de Ceilândia existe desde 2024 e já transformou a vida de outros moradores como seu Francisco, usuários que visitam semanalmente o espaço e afirmam ter superado a depressão por meio do contato com a terra e da convivência com a equipe e vizinhos.
Esse é o caso da aposentada Marizete Lobo Batista, 68, que foi encaminhada à UBS para fazer atividades físicas após ter sido diagnosticada com depressão e pressão alta. Chegando a pesar mais de 100 kg antes de começar a trabalhar na horta, atualmente ela conta com a pressão estabilizada e o peso controlado, descrevendo o trabalho diário e voluntário no espaço verde como uma salvação para melhorar as condições de saúde.
“Eu estava no fundo de um sofá, só sabia comer, dormir e assistir televisão. Procurei um posto de saúde porque minha pressão estava em 19 por 12, estava para ter um infarto. Hoje me sinto uma pessoa realizada, 99% da minha saúde foi recuperada aqui no horto. É um paraíso para mim. Gosto de mexer na terra, plantar, colher e pôr na mesa para quem está com fome, além de me tratar nesse processo. Reconheço muito tudo que fizeram por mim e vou passar o legado para minhas filhas, netas e bisnetas”, destaca.

Reconhecimento nacional
Atualmente a SES-DF conta com 30 hortos em unidades de saúde, totalizando mais de 8 mil metros quadrados de área cultivada com o envolvimento direto de gestores, profissionais e usuários do SUS. Em 2024, a Rede de Hortos da pasta foi reconhecida como uma das três experiências nacionais mais bem-sucedidas na área de segurança alimentar e nutricional, reforçando o impacto dessa política pública na qualidade de vida das comunidades.
À frente da UBS 9 de Ceilândia, a especialista em saúde pública Luana Caroline Souza afirma que os profissionais do projeto participam de um curso cuja proposta é montar uma agrofloresta, com plantas comestíveis e medicinais para serem utilizadas como matéria-prima para medicamentos.
“É uma área de integração social, onde qualquer um pode participar. O pessoal 60+ tem mais participação do que de jovens e ocupa o tempo aqui. Tudo que produz fica para a comunidade, que usufrui das plantas para fazer chás de erva-cidreira, capim-santo, espinheira-santa e outras hortaliças”, observa. A farmacêutica reforça, ainda, que o sentimento de pertencimento e propósito aliado ao trabalho coletivo e ao contato com a natureza promove confiança, vínculos afetivos e saúde emocional.
Para a dona de casa Helena Maria da Costa, 72, uma das partes mais importantes do projeto é a interação social, além da oportunidade de atuar em uma área verde ampla e rica. “Em casa, eu ia do sofá para a cama e da cama para o sofá. Cansei dessa vida e vim para cá, onde trabalho com gosto, satisfação e alegria. Aqui a gente mexe na terra e conversa tanto, que é uma interação boa demais. No dia que eu não venho, sinto falta. Somos uma dupla de três: eu, Marizete e Francisco”, brinca.
Fonte: Agência Brasília