Discutir melhorias e prevenções contra a pandemia da Covid-19 no sistema prisional de Mato Grosso foi um dos objetivos da Audiência Pública “Impactos da Pandemia no Sistema Prisional e Estratégias para Aprimoramento da Execução Penal”, realizada na sexta-feira (2/7). Foram mostradas estratégias adotadas para amenizar a necessidade de distanciamento das famílias das pessoas presas durante a pandemia, com videoconferência e cartas dos familiares, na tentativa de minimizar a falta do contato.
O corregedor-geral do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), desembargador José Zuquim Nogueira, citou dados sobre as pessoas presas. “No ano passado o Brasil tinha 709.205 presos, este ano são 687.546. Embora tenha diminuído o número ele ainda é gigantesco. Estamos na 26º posição, entre os países que mais prendem no mundo. São 322 encarcerados a cada 100 mil habitantes. Temos a 3ª maior população carcerária do mundo.”
Ele ainda lembrou que são apenas 440 mil vagas disponíveis no sistema nacional e que 217.700 são presos provisórios, o que corresponde a 31,7% do total de pessoas presas do Brasil. “Dados do CNJ apontam que 200 presos morreram de Covid 19 no Brasil, 237 servidores perderam suas vidas em decorrência da mesma doença. Aqui em Mato Grosso, temos 11.436 recuperandos distribuídos em 47 unidades prisionais do estado. Conseguimos vacinar pouco mais de 20% da população carcerária e tivemos quase 3 mil casos confirmados da doença entre os internos e 6 óbitos. Mas tenho que salientar que nossos magistrados e suas equipes têm feito avanços utilizando a tecnologia e sensibilidade neste momento de vulnerabilidade que estamos enfrentando.”
Nogueira ainda ressaltou questões culturais a serem superadas. “Importante destacar que em nosso país temos a cultura do encarceramento e a audiência de custódia tem como um dos seus objetivos evitar a prisão desnecessária. A ministra Carmem Lúcia cirurgicamente, na Conferência Brasil para a Paz, disse: ‘Qualquer prisão é determinada por um juiz e a soltura, igualmente. A responsabilidade pelo preso é nossa. Isso tem tudo a ver conosco. Temos que saber quem está preso, por que está preso, por quanto tempo está preso e em que condições está preso. Isso é um problema do Poder Judiciário, que por muito tempo que não assumiu plenamente que ele precisa, tem de verificar essa situação Toda vida importa!’.”
O conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Marcos Vinícius Jardim Rodrigues afirmou que o sistema prisional foi bastante impactado pela pandemia e que o CNJ buscou contribuir para superar as dificuldades. “A campanha de vacina nos presídios e capacitações voltadas a esta temática foram reforçadas. Fizemos recomendações visando aos magistrados conduzirem este momento difícil. O fundamento maior deve ser levado à sociedade brasileira. Ela sim deve discutir mais o sistema com objetivo de melhoria, e alcançarmos a ressocialização e trazer assim a paz social que tanto pretendemos.”
“A exposição feita pelo corregedor Zuquim nos mostra a precariedade do sistema. O Supremo e o CNJ têm buscado o aprimoramento junto com os Tribunais”, afirmou o ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. “A pandemia nos mostrou uma série de fragilidades do Brasil, no sistema sanitário e também no sistema prisional. Se já tínhamos a superlotação, conhecemos outros diversos problemas nesta oportunidade. Descobrimos que muitas pessoas não foram beneficiadas pelo auxílio do governo, ou seja, temos muito a discutir, não apenas pela pandemia, mas o sistema penitenciário brasileiro deve ser discutido e deitarmos nossos olhos sobre ele.”
Para o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, a discussão é muito relevante. “Como cidadão e agente público, eu não compreendia muito bem por que ouvíamos que cerca de 80% dos presos eram reincidentes. Talvez seja pela forma como o sistema prisional funcione atualmente. Estruturas precárias não ajudam na ressocialização. Tínhamos pouco mais de 6 mil vagas e a população carcerária era de quase 12 mil presos. O governo já decidiu pela construção de mais 4 mil vagas no sistema penitenciário. Destas, mais de 1,6 mil vagas foram concluídas. Ter condições físicas adequadas dentro do uma metodologia de trabalho, será crucial pela recuperação das pessoas.”
“Somando reeducandos e trabalhadores do sistema, já contamos com quase 500 mortes dentro do sistema prisional. Nosso país não conta com penas perpétuas e muito menos com penas de morte. Vislumbro dois fatores com Poder para mudar esta realidade. Em primeiro lugar, o Executivo, que muito pode fazer. E também o Judiciário, que é o zelador do sistema”, defendeu a corregedora nacional de Justiça, ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura.
Segundo a presidente do TJMT, desembargadora Maria Helena Gargaglione Póvoas, os desafios serão superados em parceria. “Desde a década de 90, quando exerci a Presidência da OAB do estado, isso já me causa uma angústia. Se a pena for cumprida, como o cidadão sairá de lá? Graças a Deus aqui não temos pena de morte ou prisão perpétua, como disse a corregedora nacional. Devemos contribuir para que este cidadão saia de lá melhor do que quando entrou. A sociedade precisa entender que este ser humano sairá de lá e que se a pena não cumprir sua função social, ele voltará a cometer crimes.”
Fonte: TJMT
Fonte: Portal CNJ